4.24.2012

Há coisas que penso e que não sei descrever sem usar sinestesia. (Se é que, justamente por ser a única forma de explicar a coisa, deixa de ser uma figura de linguagem e passa a ser um sentido denotativo mesmo). Não quero ser pesada, por exemplo. Não gorda, pesada. Quando a forma de pensar tem sobrepeso, e você a carrega pela vida, nas costas ou arrastando-a pelo asfalto - o que te desgasta e te dói pelo atrito, por ser, afinal, parte sua. Tem os seus neurorreceptores anímicos de dor.

Sei que minha mãe sempre foi muito pesada. Desde criança, ela tentava me lembrar de tomar cuidado pra não me distrair com métodos bonitinhos de me lembrar da matéria da escola e acabar esquecendo da matéria propriamente dita, e eu nunca fiz isso. Sou distraída, mas não a esse ponto. Ela também não gosta de humor sarcástico, o que eu adoro. Isso faz parte do que chamam de 'levar tudo muito a sério', mas não é só isso que pesa nela. No início do ano, eu estava conversando com ela que queria me ser uma melhor aluna na faculdade, no que me sugeriu que eu fizesse uma 'carta de intenções'. A idéia era escrever uma promessa à mim mesma, comprometendo-me a me dedicar aos estudos, enumerando como fazer isso e dissertando porque eu tinha decidido fazê-lo, e andar sempre com ela comigo. Sugestão bonitinha, mas... desnecessária. Bastava o bom uso da agenda que ganhei de presente da minha melhor amiga. Pra quê ritualizar tanto?

Rituais são coisas que eu costumava fazer muito. Sabe, fazer algo mais pela 'licença poética' do que pela atitude em si. Cantar músicas tristes em situações tão tristes quanto não é somente catártico, é lindo. Não importa que eu desafine a cada três notas, possíveis ouvintes ou o simples fato de isso tentar embelezar uma situação muito ruim sem resolvê-la - é uma belíssima história de se contar. O que nos leva a outra coisa pesada: pensar demais no passado. Não falo em endeusar certos anos como se fossem perfeitos, ou  gritar pra quem quiser ouvir como eles foram o inferno temporal na terra (inferno que é, na verdade, uma linda comédia de humor negro porque eu sou uma pobre coitada engraçada). Simplesmente pensar nele demais. Dissecar suas partes e remontá-las, tentar prever o que teria acontecido se certas partes fossem substituídas e se isso seria bom ou ruim. Como se fosse possível fazer especulações precisas. A memória que tenho do ano que até hoje lembro como mais feliz da minha vida não é muito organizada; lembro de alguns eventos e da época deles, mas não do ano como uma história contínua - só lembro-me que fui feliz. Essa lembrança imprecisa, mas sempre existente, provavelmente é dessa forma porque é, sim, muito importante saber por onde se esteve e onde se está, mas é mais importante ainda saber para onde se quer ir. E era nisso em que eu me foquei naquele ano. Caminhar constantemente rumo ao progresso, às coisas boas que talvez a nossa mente não saiba ainda imaginar direito, mas saiba que sonha com elas (e sempre saber quais são seus sonhos, sempre!). E por isso, não faz muito sentido fazer algo só pela poética da coisa, a não ser que seja tão útil que possa logicamente (porque eu odeio 'racionalmentes' e até sentimentos têm a sua lógica) te ajudar ou aos outros a resolver o problema de fato, ou tão inútil que não faça muita diferença em existir ou não. Ponto pra cantar alto num lugar quase vazio, só pela catarse e pela oportunidade de treinar a voz ruim.

O meu medo é que muita leveza acabe me levando a ser menos intensa. Gosto de ter emoções fortes, de tê-las a ser defendidas, de tirar mais F que T no Myers-Briggs e de ser uma mulher marcadamente passional. Quero continuar sendo adicta da droga auto-gerada que é o meu sentimentalismo e viver tendo-o como minha bússola inseparável (o que não quer dizer que eu não caminhe pelas estradas da razão), mas sem que isso atrapalhe minha vida. Que eu não fique andando em círculos. Porque é como se o peso em excesso fosse uma âncora quebrada que nunca é completamente içada, mas a vida fosse como um rio, que flui. Mas barcos têm uma densidade conveniente e motor - até mesmo âncoras, desde que funcionais e capazes de facilmente se retrair ao convés - e dessa forma navegam. Como farei isso?

(E eu continuo me perdendo nas malditas metáforas.)
E pode ser que eu esteja muito próxima de ser feliz como desejei há tanto tempo, mas me vêm a insegurança de quem sabe que dará um grande salto direto no desconhecido, esse suspeito abismo...